Você está navegando no Facebook e de repente lembra o nome completo daquele seu colega da oitava série (eu mesmo me lembro porque ouvia repetidamente a lista de chamada no início da aula), resolve fazer uma busca e voilá: logo reconhece o semblante da pessoa, numa conferida rápida no perfil confirma ser aquela figurinha extrovertida ou tímida, boa de bola ou perna de pau, calada ou conversadora...enfim, que você lembra nitidamente da sua infância.
Por nostalgia ou curiosidade manda uma mensagem e fica na expectativa de um retorno, algum tempo depois recebe de volta um breve olá.
- E aí, como vai? (diz você)
- Tudo bem. (que resposta seca penso eu)
- Casou? O que faz na vida? (eu insisto já meio receoso)
-Tá td bem, sou funcionário público. (meio vago penso eu, precisava abreviar o tudo?)
Pausa de 5 minutos para ver se a pessoa acrescenta alguma coisa e nada. Enquanto isso eu revivo em minha mente os momentos que nos divertimos nos intervalos, sempre tínhamos assunto ou brincadeiras, me lembro do banco em que sentávamos no pátio para conversar e dos trabalhos escolares que fizemos juntos. Cara como eu admirava aquele sujeito, a mochila descolada de lona verde que ele tinha, os rabiscos de caneta no tênis All Star, cada detalhe bobo que na juventude soava como pura afirmação de personalidade.
Agora, porém o cara mal me responde, é quase monossilábico, será que não uma boa hora? Estará ocupado? Ou simplesmente não está interessado em reencontrar seu velho amigo de infância. Como vou saber hora bolas! A empolgação se transforma rapidamente em indignação e num ímpeto de autodefesa encerro a conversa antes que ele o faça.
E assim a conversa termina antes de começar, talvez seu amigo estivesse num momento ruim, ou absorto em uma questão de trabalho (todos ficamos hoje em dia não é verdade?), talvez seu ex-colega de infância tenha olhado seu perfil e achado que você está muito bem por causa daquela foto que você postou tirada nas férias, na Europa, um tempão atrás e ficou encabulado, achando que está que você está bem melhor de vida do que ele. Pode ser sim que ele nem ligue ou sequer se lembre de você, mas se levar em conta apenas as possibilidades que citei, as chances de você estar certo nas suas conclusões são de apenas 25%.
São nossas pequenas neuroses se manifestando, nos tornamos presunçosos achando que sabemos ler as outras pessoas através de suas mensagens de texto combinadas com fotos e os toscos emojis que acabaram se tornando um complemento pobre para dar alguma entonação a nossas mensagens.
Estamos escrevendo nossos pensamentos sem nuance, sem volume, sem tonalidade, sem ritmo. Estamos pisando em terreno que poucos sabem como caminhar.
Algumas poucas pessoas possuem a desenvoltura de se expressar de maneira sincera e ao mesmo tempo gentil na forma de texto.
O Livro Cartas a um jovem poeta de Ranier Rilke é um belo exemplo da arte de se expressar em texto. Em alguns pequenos recortes ele diz:
"As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou" "...seus versos não possuem feição própria, somente acenos discretos e velados de nossa personalidade."As redes sociais operam como uma extensão do nosso mundo social. Nossos "eus" são estendidos online e nos deixam vulneráveis à percepção dos outros de um jeito que nunca vimos.
Acho que o grande desafio para nos relacionarmos tanto antes como agora é o propósito de sermos mais generosos ao interpretar as outras pessoas e mais criativos e sinceros ao nos comunicarmos.